quarta-feira, outubro 03, 2007

“POPULISMO É NADAR NO TEJO E FAZER DE TÁXISTA” - ÂNGELO CORREIA

Entrevista dirigida pelos jornalistas Francisco Teixeira e Márcia Galrão.
Ângelo Correia quer um partido mais liberal quanto às funções do Estado. Ganhar em 2009 é possível diz o mandatário do novo líder do PSD.

Foi o mandatário da candidatura de Luís Filipe Menezes porque era “preciso dar uma pedrada no charco”. Ângelo Correia admite que é possível ao PSD voltar ao Governo já em 2009, mas essa tarefa exige muito trabalho. Enquanto a Sócrates não augura nada de bom (“A economia não vai avançar”), ao PSD deixa vários recados: é preciso defender políticas mais liberais, com um Estado mais pequeno e mais eficaz que não pode ser “árbitro e jogador” ao mesmo tempo.

É possível o PSD derrotar Sócrates já em 2009? É, porque ele vai ter um problema: a economia não vai avançar. Os ‘fundamentals’ da evolução da economia são todos negativos.

Mas este Governo tem tido resultados na economia que os próprios analistas apontam como positivos. Será um factor determinante? O estado da economia é definitório do estado de espírito das pessoas em 2009. Nos últimos dois anos o Governo fez fundamentalmente a redução do défice à custa do aumento de impostos. Isso atingiu um patamar tão elevado que já não pode ser mais aumentado. Mas o problema é na despesa pública, onde tem que haver coragem para mexer em áreas, como as protecções sociais. É preciso verdade sobre as coisas, mesmo que custe ouvir e custe entrar em funcionamento. Todo o país sabe que vivemos acima das nossas posses. Temos que confrontar os portugueses com o que são. Têm que ser todos responsabilizados, acabando com a eterna ideia de que há uma vaquinha chamada Estado que ajuda o povo. Cada um tem que ajudar a resolver os seus problemas.

O Governo defende que estamos com resultados nunca vistos…À custa da extinção do investimento público, do aumento da despesa, que gerou um crescimento económico que não chega aos 2%. O brilharete do Estado é o crescimento mais medíocre da Europa. É uma falta de ambição, o chamado contento com a insuficiência. É a lógica de Sócrates, mas não pode ser a lógica de um país que se quer modernizado e a crescer.

Não será a lógica de Menezes, olhando para o exemplo da Câmara de Gaia? Não pode. O exemplo de Gaia é bom.

À custa de endividamento? O problema é que há endividamento que é virtuoso e outro que é meramente consumista. Quando gera bem estar, rendimentos, sustentabilidade aos projectos, com o tempo o endividamento é reprodutivo.

Tem uma visão de um PSD mais liberal? O PSD que tem que perceber que a prioridade do país é a economia. As três prioridades deste Governo são a economia, economia e economia. Colocar Portugal numa plataforma de competitividade, sem isso não há capacidade de resolver os outros problemas sociais. Não posso pôr como prioridade a resolução dos problemas sociais quando não tenho meios.

Tem que ter um partido mais liberal para conseguir ser mais social-democrata? Um partido que na economia seja mais liberal, mais atento. Capaz de gerar meios necessários para manter um estado social adequado à nossa tradição e aos objectivos da social-democracia.

É uma inversão da lógica actual…Obviamente. Os objectivos sociais não são o objectivo político, mas uma decorrência do que ocorre na economia. Queremos cortar este nó-gordio de análise e de política que está errado. Estou a dizer o que Luís Filipe Menezes pensa e que subscrevo.

Menezes chegará a 2009 com força para derrotar Sócrates? Depende de duas coisas. Da modernização do partido, da produção intelectual do PSD, da construção de um programa de Governo alternativo, para que seja um momento de contraponto em relação à não política do Governo. Mas a vitória depende também da erosão ou não do Governo. Se o programa de Menezes for eficaz ajuda a essa erosão.

Dois anos são suficientes? Não é algo que se faz em quinze dias. Temos que exercer a vida política com o profissionalismo das empresas modernas.

E o PSD tem gente? E de que maneira. É preciso é mobilizar toda a gente num esforço comum.

O que deve fazer o PSD de diferente, na educação, na justiça…É uma discussão de todo o partido com a sociedade civil. Mas vamos ter uma diferença em relação ao Governo: em como cortar nas despesas públicas. O problema do país está no excesso do peso do Estado, dos gastos do Estado e das pessoas que estão no Estado. Se não resolvermos isto com o mínimo custo social, mas sempre com algum, não podemos mexer em nada.

E na reforma da Administração Pública. O que farão de diferente? Não é só na Administração central, é também na local. Não compreendo as autarquias que são os maiores empregadores do país, com várias empresas municipais falidas. Todos os serviços em que há intervenção económica forte o Estado não deve gerir, deve concessionar. O Estado não pode ser árbitro e jogador.

É importante renovar o PSD em toda a linha? De duas maneiras. Trazer pessoas que estão fora há muito tempo. Segundo, criar uma escola de formação de quadros políticos.

“POPULISMO É NADAR NO RIO TEJO”

O que traz Menezes até á liderança do PSD? Uma perspectiva de alguma esperança.

Tem algumas reticências… É, apenas, a dose normal de percepção das dificuldades que vai enfrentar. Em primeiro lugar, algum enquadramento politico-comunicacional que o começou a hostilizar, acusando-o de populismo.

Menezes não é populista? Pelo contrário. Populismo é alguém nadar no rio Tejo quando se faz campanha por Lisboa, disfarçar-se de motorista de táxi ou condutor de automóveis.

Está a falar de Marcelo Rebelo Sousa. Não estou a falar de ninguém em especial. Menezes não é populista, tem é uma capacidade de comunicação com as bases.

Está disponível para trabalhar na sua equipa? Participei voluntariamente. Mas durante algum tempo para voltar à minha profissão.

Não está disponível… Para voltar à política activa não. Nunca serei vice-presidente da Comissão Política Nacional, nunca serei um quadro permanente que regressou à política a full-time. Contribuirei em algum órgão do congresso, na medida das minhas possibilidades.

Muitos dos chamados “barões” apoiaram o outro candidato. O que isto significa? Fiquei chocado por ver um conjunto de pessoas que diziam todos os dias mal de Marques Mendes e no dia a seguir o apoiavam. Senti que havia uma atitude de hipocrisia no apoio à candidatura de Mendes e tive pena dele. Mas também senti a debilidade. Enquanto o bloco político que apoiava Mendes não era convicto, do lado de Menezes havia um desejo de mudança.

Qual era a estratégia desse não apoiantes de Mendes? Queimá-lo em banho maria.

Quem ganhava com isso? Ninguém, nem eles próprios. Nem mesmo os que queriam ser solução em 2009 .

Os ditos “cavaquistas”… Não gosto de misturar o professor Cavaco e o seu nome com alguns movimentos que pretendem sobreviver à custa do seu nome. Cavaco Silva é Cavaco Silva. O cavaquismo não existe sem Cavaco.

Como é que acha que Cavaco vai conviver com esta liderança do PSD? Bem, porque vai ser respeitadora de duas coisas. Primeiro, da pessoa de Cavaco Silva. Do ponto de vista político, se houver alguma razão em que tenhamos que estar contra, será em privado. Segundo, ninguém espera da futura liderança do partido actos de hostilidade a Cavaco Silva.

Mas a incompatibilidade de perfis entre Cavaco e Menezes é evidente... Um é mais contido, outro é menos. Os cinco dedos da mão têm funções tão diferentes, mas são essenciais.

A Menezes aponta-se muito a emoção, impulsividade e até inconstância nas decisões... Chora e emociona-se. Ainda bem. É prova de que é humano, que sofre. Já vi um Presidente da República fazer isso e cada vez que o fazia todos tínhamos um sentimento de afecto. As pessoas não compreendem aquele que é indiferente às emoções.

Mas é um estilo contrário ao de José Sócrates. Completamente. Mas não sei onde está a virtude: se na transparência ou na ocultação.

Alexandre Relvas, Militante do PSD. É um nome com potencial, mas Ângelo Correia considera que Alexandre Relvas “pode dar mais quando estiver desligado dos epítetos”, como o de ser o “Mourinho de Cavaco”. Até aqui, Relvas tem sido responsável pela elaboração do programa eleitoral do PSD para 2009, uma função que Ângelo Correia diz que “tem que ser repensada”. “É óbvio que deve colaborar”, num programa que deve ser elaborado com “ tudo o que temos que fazer nos primeiros 100 dias”. Decretos de lei incluídos.

Pedro Passos Coelho, Militante do PSD Ex-líder da JSD, apontado como uma solução de futuro para o partido, recebe em Ângelo Correia rasgados elogios. “Tem grandes condições para vingar, se chegará a líder não sei”. Reconhece-lhe, ainda assim, características de “homem sério, rigoroso, que estudou e se valorizou profissionalmente”. O histórico social-democrata vê com “alegria” a chegada de “ vozes dissonantes mas prospectivas. Alguém que não me diz que sim, que me diz não e explica porquê”, conclui.

O EMPRESÁRIO QUE PEDIU “CENTENAS DE CUNHAS” COM “MUITO PRAZER”

É ao PSD que o seu nome aparece mais vezes associado, pela intervenção política e a ligação a Sá Carneiro, mas Ângelo Correia é antes de mais um empresário e um gestor, responsável nos últimos anos pela estratégia da Fomentinvest, a holding portuguesa que criou o primeiro fundo de carbono do país.

Ângelo Correia não teme as críticas nem se inibe de dizer o que pensa só porque não é politicamente correcto. Sempre presente no partido e na política, só com Francisco Pinto Balsemão aceitou integrar um Governo, então como ministro da Administração Interna. Quando o Governo caiu em 1983, Ângelo Correia abandonou os cargos políticos para não mais voltar.

Mas a sua reconhecida frontalidade, nunca o inibiu de usar a sua influência política, como admitiu em tempos numa entrevista, confessando ter utilizado “muitas vezes” as relações que estabeleceu enquanto político para “fazer negócios privados”. E embora reconhecendo que não é “ético”, admitiu também que foi com “muito prazer” que ao longo da vida já meteu “dezenas, centenas” de cunhas.

Formado em Engenharia Química e Administração de Empresas pelo Instituto Superior Técnico, foi no início do ano eleito presidente das Câmaras do Comércio e Indústrias Arábes.

Foi um dos empresários que Sócrates levou na visita à Rússia, de onde trouxe um acordo assinado com a Gazprom no valor de 20 milhões de euros, para compra de licenças de carbono.

Quando o seu nome foi associado à candidatura de Menezes muitos surpreenderam-se ao ver um “barão” a apoiar um candidato conotado com as bases. Mas, mais uma vez, Ângelo Correia demonstrou que tem visão. Tal como em 1985 percorreu as bases e defendeu a moção que elegeu Cavaco Silva líder do partido na Figueira da Foz, em 2007 foi o “cérebro” da candidatura de Luís Filipe Menezes, o desafiador do líder em funções, Marques Mendes.

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